SÃO PAULO SEU 'TEATRO DE INTERVENÇÃO'
A jovem companhia teatral apresenta no Largo de Santa Cecília a peça "Contos de Lua no Chão", criada coletivamente a partir de contos do escritor moçambicano Mia Couto. O espetáculo é aberto a interferências dos transeuntes o público torna-se co-criador da obra.
FOTOS: YURI AMARANTE |
O Grupo do Trecho em duas cenas de "Contos de Lua no Chão", peça de "teatro de intervenção" que se realiza no Largo de Santa Cecília. O espetáculo é aberto a interferências dos transeuntes o público torna-se co-criador da obra. |
"Contos de Lua no Chão" coloca em cena o Grupo do Trecho, jovem companhia teatral nascida em Campinas em 2007 e integrada por Bruna Freitag, Carolina Nóbrega, Luciano Mendjes, Nádia Recioli e Tatiana Burg.
Diferentemente de peças teatrais encenadas em ruas e espaços públicos, a proposta de "teatro de intervenção" mexe com os limites entre o que é real e o que é fantasia. O resultado é, digamos, uma "confusão de recepção" pelo público, que muitas vezes não percebe tratar-se de um espetáculo teatral, não consegue exatamente definir se o que vê é realidade ou ficção.
"No 'teatro de intervenção' o espectador torna-se mais ativo e a ficção pode atravessá-lo sem necessariamente passar pelos filtros de recepção de uma obra de arte", explica Carolina Nóbrega, atriz e pesquisadora de linguagens teatrais do Grupo do Trecho.
Em síntese, o "teatro de intervenção" gera espetáculos abertos, nos quais o público torna-se co-criador da obra. É um teatro que não se produz no espaço isolado da sala de ensaio para só depois ser aberto ao público.
Análogos poéticos "Contos de Lua no Chão" é uma criação coletiva do Grupo do Trecho, a partir da livre adaptação teatral de contos de Mia Couto [ver quadro mais abaixo]. A peça foi construída a partir de um processo de residência artística no Largo de Santa Cecília, no qual o Grupo do Trecho buscou estabelecer "análogos poéticos" entre a realidade local e os contos "As Lágrimas de Diamantinha", "O Embondeiro que Sonhava Pássaros" e "O Cego Estrelinho", do escritor moçambicano.
A pergunta "como essa história aconteceria nesse contexto?" serviu de orientação para a criação das narrativas, através da busca de sensibilização dos integrantes do grupo em relação ao espaço.
A encenação se dá em um círculo demarcado ao redor da Igreja de Santa Cecília. As histórias apresentam a trajetória patética de personagens que entram em desajuste com a realidade, procuram transformá-la e são esmagados por ela:
- uma mulher que faz um voto de fome na busca de frear o ritmo da vida e poder encontrar sentimentos sinceros, é explorada comercialmente, tendo sua imagem deturpada pela apropriação de suas palavras ("As Lágrimas de Diamantinha")
- um vendedor bizarro e andrógino de pássaros exóticos provoca a ira numa cidade pela relação duvidosa que estabelece com uma menina ( "O Embondeiro que Sonhava Pássaros")
- uma cega é guiada por uma mulher doente, que mente travestindo a realidade num lugar bom; quando ela parte, a cega se depara com a brutalidade do mundo através da visão de um homem comum ("O Cego Estrelinho")
Ela acrescenta que esse foi o ponto de convergência com as histórias de Mia Couto, nas quais o escritor desenha figuras estrangeiras, desabitadas. "As histórias, entretanto, foram inevitavelmente desfiguradas pelo contraste entre a realidade interiorana nelas descrita e a rigidez caótica do espaço urbano."
Carolina Nóbrega fala ainda sobre a opção pela encenação em horário noturno (a partir das sete horas da noite): "percebemos que isso implicava na pesquisa de diferentes formas do teatro acontecer na rua, que não as tradicionais, ao mesmo tempo em que joga com a convenção noturna do teatro adulto de palco e transporta recursos técnicos, como o de iluminação, para o espaço público".
O processo de criação coletiva da peça teve orientação teórica do filósofo Luiz Fuganti e orientação artística de três diferentes diretores: Verônica Fabrini ("As Lágrimas de Diamantinha"), André Carreira ("O Embondeiro que Sonhava Pássaros") e Grácia Navarro ("O Cego Estrelinho").
Ações performáticas O Grupo do Trecho foi formado em Junho de 2007 por quatro alunos de artes cênicas da Unicamp, para o desenvolvimento de um projeto de conclusão de curso.
A proposta da companhia é pesquisas o teatro como "recurso de intervenção na esfera urbana, colocando o jogo teatral em um ambiente de risco, no qual a ficção é atravessada pela realidade concreta".
No segundo semestre de 2007 o Grupo do Trecho realizou as ações performáticas "Figuras entre a Ficção e a Realidade", no centro de Campinas, sob a orientação de Grácia Navarro, e fez temporada do espetáculo "Sapato Sujo na Soleira da Porta", com direção de Grácia Navarro no Samim, albergue público de Campinas.
Em 2008 realizou em São Paulo o espetáculo "Sapato Sujo na Soleira da Porta", em dois albergues públicos da Rede Rua, em Santo Amaro.
Em paralelo, o grupo ministrou oficinas de teatro aos moradores dos albergues da Rede Rua e desenvolveu as ações performáticas "Figuras entre a Ficção e a Realidade" no centro de São Paulo.
Ainda em 2008, em Julho, o Grupo do Trecho levou "Sapato Sujo na Soleira da Porta" ao 22º Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau, com apresentação no Albergue Municipal de Blumenau.
Além de peças teatrais, o Grupo do Trecho desenvolve também trabalhos de performance e happening, nos quais cada um dos integrantes da companhia se coloca de maneira "mais individual". Conceitualmente, parte-se do pressuposto de que para gerar a intensidade de troca esperada com o ambiente da rua é necessário que o próprio artista se exponha e corra riscos, em cumplicidade real com o espectador.
Nos trabalhos de performance e happening o Grupo do Trecho utiliza recursos de diversas expressões artísticas artes plásticas, música, cinema e dança , criando assim um amplo leque de possibilidades de intervenção através de uma linguagem híbrida, de definição menos reconhecível.
A companhia compartilha suas descobertas através de oficinas, aulas e ensaios abertos e ainda através do blog grupodotrecho.blogspot.com e da revista No Trecho.
MIA COUTO (1955- ), moçambicano de Beira, é um dos mais importantes escritores africanos de língua portuguesa. Tem dezenas de livros publicados O Outro Pé da Sereia, seu mais novo romance, acaba de ser lançado simultaneamente em Portugal e no Brasil. "As Lágrimas de Diamantinha" é do livro Na berma de nenhuma estrada (2001); "O Embondeiro que Sonhava Pássaros", do livro Cada Homem é uma Raça (1990); e "O cego Estrelinho" do livro Estórias abensonhada (1998). |
S E R V I Ç O Contos de Lua no Chão O projeto "Contos de Lua no Chão" foi contemplado pelo ProAC 2009, Programa de Ação Cultural da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo |
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