Henilton Menezes – A nova lei de incentivo à Cultura

 

O projeto de lei que institui oPrograma Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura – Proculturapretende rever a atual Lei Federal de Incentivo à Cultura, a Lei Rouanet, e melhor equilibrar os mecanismos por ela propostos. De acordo com Henilton Menezes, daSecretaria de Fomento e Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura – Sefic, “o que se quer com a nova lei é consertar as fragilidades que a lei atual tem”.

Atualmente em avaliação na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, a expectativa do secretário é de que a nova lei seja aprovada entre 2012 e 2013 e possa entrar em vigor, por se tratar de lei de incentivo fiscal, no ano de exercício fiscal seguinte, 2014.

Confira abaixo entrevista com Henilton Menezes, que explicou ao Acesso quais serão as principais alterações nos mecanismos de incentivo à Cultura propostas peloProcultura. Confira também, neste link, apresentação do secretário que aborda a operacionalização do atual mecanismo de incentivo à cultura e o histórico das mudanças no texto do projeto de lei ProCultura.

Acesso – Uma crítica feita à atual lei de incentivo é que a escolha dos projetos que receberão recursos acaba concentrada na mão das empresas. A nova lei busca rever essa situação?

Henilton Menezes ­– Essa é uma prerrogativa do incentivo fiscal. Cada empresa tem a prerrogativa de colocar os seus recursos onde achar que vai ter mais visibilidade, então isso não muda. O incentivo fiscal está calcado nessa hipótese de que a prerrogativa é do empresário. O governo dá o incentivo para o empresário colocar recursos na manifestação ou ação cultural, mas cabe a ele definir isso, não ao Ministério. Isso não muda.

Acesso – Como alcançar, então, os projetos culturais que não se enquadram nessa lógica do empresário?

H. M. ­– A lei atual está montada em um tripé. O primeiro pé é exatamente o incentivo fiscal, no qual há uma lógica desenhada de que o empresário tem a prerrogativa de alocar o recurso do imposto de renda – quer dizer, a gente sabe que é do governo, mas enquanto não vem para o governo é dele. Nessa lógica, o empresário vai colocar o recurso onde ele tem mais interesse. Por exemplo, se o empresário atua no Ceará, e não na Paraíba, ele quer que a marca dele seja exibida no Estado do Ceará. Aí não tem nada de errado se a gente considerar o tripé.

O outro segundo pé é exatamente o Fundo Nacional de Cultura, que foi criado na época, mas ao longo dos anos ficou nanico, ficou sem força. Com o Fundo Nacional, o Ministério teria, teoricamente, a condição de chegar naquelas áreas e naquelas ações em que o empresário não chega ou não quer chegar. São ações importantes para o desenvolvimento da cultura brasileira, mas que o empresário, dentro da lógica dele, não enxerga como uma boa oportunidade. Então, o governo tem o Fundo Nacional para chegar nesses lugares. Quando a gente diz que o investimento do incentivo fiscal está concentrado nos Estados do Rio e de São Paulo – isso é sempre uma pauta da imprensa, está sempre no discurso dos produtores culturais –, isso, na verdade, é um reflexo da concentração do PIB nacional. As empresas estão, em geral, com as suas sedes no Centro-Sul do País. Para fazer uma compensação a essa lógica, eu teria que ter o fundo, então essa é uma fragilidade da atual lei: o fundo não tem oxigênio.

Acesso – A proposta do Fundo Nacional de Cultura, então, não se concretizou?

H. M. ­– Para você ter uma ideia, em 2003, o valor que se tinha para o incentivo fiscal era algo em torno de 300 milhões e o valor que se tinha para o Fundo Nacional era mais ou menos a mesma coisa. Hoje, o valor que eu tenho, que eu opero no incentivo fiscal para 2012, é de 1,6 bilhão e o valor do fundo é de 200 milhões. Não temos políticas compensatórias para essa lógica do empresário, então a questão não é mudar a lógica do empresário, é reforçar a capacidade de um mecanismo compensatório para o Ministério da Cultura. Na nova lei, se pretende reforçar oFundo Nacional de Cultura para que ele seja mais robusto e possa de fato servir como foi criado, por lógica compensatória.

Acesso – Como será feito esse reforço?

H. M. ­– Na nova proposta, pretendemos vincular um percentual do Imposto de Renda dos empresários para doação ao fundo. Estão sendo mantidos os mesmos 4% para o empresário optar nos seus investimentos, mas estamos propondo que mais 2% seja voltado para o Fundo Nacional de Cultura. Imaginando que a lei futura estivesse em vigor, eu teria um orçamento de incentivo fiscal de 1,6 bilhão e um fundo de 1,2 bilhão. Assim, equilibramos melhor essas duas forças, esses dois mecanismos.

Acesso – E qual é o terceiro pé do tripé mencionado anteriormente?

H. M. ­– O terceiro pé é o Fundo de Investimento, que também foram criados pela lei de incentivo atual, só que nunca saíram do papel porque foram criados sem nenhuma atratividade para os investidores. O Fundo de Investimento funcionaria como um banco, no qual as ações que são lucrativas, que são comercialmente viáveis – por exemplo, um show da Daniela Mercury ou do Chico Buarque, um espetáculo musical de grande envergadura –, no lugar de usarem o incentivo ou o Fundo Nacional, usariam o Fundo de Investimento. O produtor desses eventos que são economicamente viáveis pode ir no fundo buscar o dinheiro, faz o empreendimento e depois devolve o dinheiro ao fundo.

Acesso – A fragilidade da lei atual, então, é o fato de dois dos três mecanismos previstos não estarem funcionando como o previsto?

H. M. ­– Esse tripé que foi criado pela Lei Rouanet ficou manco, porque somente o incentivo está funcionando de forma plena. Resultado: todo mundo vai buscar no incentivo aquilo que não consegue achar nem no Fundo Nacional de Cultura nem noFundo de Investimento. Na nova lei, tentamos equalizar novamente esse tripé para ter ações que são da lógica do empresário, em que o empresário vai querer colocar a sua marca; ações que o empresário não enxerga, mas para as quais o Fundo Nacional de Cultura pode cumprir o seu papel a fundo perdido; e ações que são absolutamente lucrativas, economicamente viáveis, que podem ir para o Fundo de Investimento.

Acesso – E como são distribuídos os recursos do Fundo Nacional de Cultura?

H. M. ­– A distribuição dos recursos do fundo é feita a partir das reuniões ordinárias da Comissão Nacional do Fundo Nacional da Cultura, que é uma comissão interna composta por todos os gestores do Ministério. Essa divisão tem um regimento. Por exemplo, 30% desse valor deverá ser repassado a Estados e municípios; 40% terá que ser distribuído via editais públicos – você tem que ter editais lançados no país todo;  e os outros 30% vão para os projetos prioritários do Ministério da Cultura, que têm com aderência à política nacional e ao Plano Nacional de Cultura. A divisão é feita e é discutida dentro dessa comissão, que se reúne três vezes ao ano,  faz avaliações e o fechamento do fundo.

Acesso – A nova lei pretende também rever a forma como são tratados os projetos de acordo com seus segmentos?

H. M. ­– Uma das mudanças também muito importantes que está se propondo é a possibilidade de ter um mecanismo que enxergue ações diferentes de forma diferente. Hoje, a lei é muito blindada. Quando foi criada, gerou o que eu costumo chamar de caixinhas. Por exemplo, se um proponente traz um projeto para um espetáculo com um quarteto de cordas na sala São Paulo, isso é classificado como música erudita. Se um outro proponente apresentar uma proposta de um quarteto de rabecas tocando no interior de Pernambuco, ele vai cair na mesma caixa, que é música instrumental. Música erudita ou instrumental estão juntas na mesma caixa. Resultado: na atual lei, tenho que tratar essas duas coisas, que são completamente diferentes, de forma igual; a lei não enxerga a diferença entre as ações. Então, a gente tem que dar o mesmo benefício para os dois casos. Com a nova lei, eliminamos a questão das caixinhas e passamos a classificar esses projetos de acordo com suas próprias características.

Acesso – Os projetos passam a ser avaliados de acordo com suas características e necessidades específicas?

H. M. ­–  Claro, são ações completamente diferentes. Essa mudança tem a ver também com aquela história do Circo de Soleil: Por que o Circo de Soleil utiliza lei de incentivo fiscal ou pode utilizar lei de incentivo fiscal? Porque, para a atual lei, ele é classificado como circo. E circo, segundo a lei, tem um tratamento igual, pode ser oCirco de Soleil, pode ser o circo do interior da Paraíba. A lei não consegue, no desenho atual, ver essas duas coisas de forma diferente. Na nova lei, no lugar de classificar somente pelo segmento, vamos poder verificar se o ingresso é gratuito; se o evento acontece em uma região remota do País; se promove a formação de novos artistas. Tem uma série de características que poderemos examinar, dar uma pontuação para a proposta e, a partir da pontuação, definir quanto ele vai receber de incentivo fiscal.

Fonte: Bernardo Vianna / blog Acesso / C&M

Nenhum comentário: